Ação foi ajuizada ainda no governo Collor em 1997; os iluministros trabalham muito quanto envolve interesses deles
O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal voltou a analisar nesta sexta-feira, 19/5, a ação direta de inconstitucionalidade que discute se o presidente da República pode, sozinho, suspender a adesão do Brasil a convenções, tratados e acordos internacionais. O julgamento vai até 26 de maio.
STF analisa possibilidade de presidente da República denunciar, sem adesão do Congresso, convenções internacionais
A ação foi ajuizada pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), em 1997, e questiona decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que em 1996 suspendeu a adesão do Brasil à Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho. A norma limita demissões sem justa causa.
Com a apresentação do voto vista do ministro Gilmar Mendes nesta sexta, o caso já tem nove votos e três entendimentos diferentes. Se considerado o voto médio, há maioria contra a denúncia de convenções tratados e acordos internacionais por iniciativa isolada do presidente da República.
Os três entendimentos formulados até aqui são os seguintes:
A presidente da Corte, Rosa Weber, e os ministros aposentados Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski afirmaram que o presidente da República não pode, sozinho, revogar o decreto sem a aprovação do Congresso. Assim a retirada do país da convenção da OIT é inconstitucional;
Maurício Corrêa e Ayres Britto, também aposentados, disseram que o decreto de FHC teve efeito imediato, mas precisa ainda passar pelo Congresso antes que o Brasil deixe formalmente a convenção da OIT;
Para Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Nelson Jobim (aposentado) e Teori Zavascki (morto em acidente aéreo em 2017), o decreto continua válido. Toffoli, Gilmar e Zavascki, no entanto, sustentaram que será preciso que o Congresso aprove decretos semelhantes em todos os outros casos futuros, a contar da definição do tema pelo Supremo.
Ao acompanhar a corrente de Toffoli, Gilmar disse que a denúncia de tratados de modo unilateral pelo presidente “não se alinha à incansável construção de um regime constitucional que se pretenda Democrático de Direito“.
“Isso porque a previsão contida no artigo 49, I, da Constituição Federal, que confere ao Congresso Nacional a competência para resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais, mediante decreto legislativo, é clara manifestação do sistema de freios e contrapesos”, disse o ministro em seu voto.
Demissões sem justa causa
Diferentemente do que começou a ser dito nos últimos meses por parte da imprensa, o Supremo não vai decidir se empregadores podem ou não demitir sem justa causa. O que a Corte decidirá é se o presidente da República pode, sem a anuência do Congresso Nacional, denunciar tratados, convenções e acordos internacionais.
Além disso, segundo ministros do Supremo e especialistas em Direito Trabalhista consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico, mesmo que o tribunal derrube o decreto de FHC que retira o país da convenção da OIT, não haverá nenhum efeito prático imediato sobre as demissões sem justa causa.
Isso porque a convenção precisaria ainda ser regulamentada por meio de uma lei complementar, o que exigiria maioria absoluta nas duas casas do Congresso (41 dos 81 senadores e 257 dos 513 deputados federais).
O advogado Carlos Eduardo Ambiel, doutor em Direito pela USP e professor de Direito do Trabalho da Faap, afirma que a convenção sequer proíbe dispensas sem justa causa, prevendo demissões por questões econômicas, tecnológicas e estruturais. Ou seja, que não envolvem necessariamente a atuação do empregado.
Além disso, explica o especialista, a convenção só recomenda mecanismos para “minimizar” os efeitos das demissões, o que também é previsto na CLT quanto às dispensas coletivas.
“Ademais, o texto da Convenção 158 da OIT sempre se reporta à necessidade de suas disposições estarem em conformidade e de serem implementadas através da legislação local. No caso do Brasil, já há previsão para quase tudo o que está na Convenção 158, como seguro-desemprego, indenização pela dispensa, aviso prévio e direito a questionar a dispensa motivada em tribunal“, comenta Ambiel.
De acordo com o professor, a única previsão que está na convenção e o Brasil ainda não utiliza é a que preceitua o direito à defesa prévia do empregado dispensado por sua “conduta ou desempenho”.
“Não parece que teremos qualquer mudança significativa daquilo que já existe atualmente, vez que nossa legislação já é extremamente protecionista e, em algumas disposições, até supera as sugestões da Convenção 158 da OIT“, conclui Ambiel.
Há ainda no Supremo uma outra ação envolvendo o tema: a ADC 39, ajuizada pela (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) e pela CNT (Confederação Nacional do Transporte).
As entidades pedem que o tribunal declare constitucional o decreto de FHC. Nesse caso, há quatro votos, sendo três deles pela inconstitucionalidade do decreto. O caso, no entanto, não está em pauta.
Fonte: Conjur