Relatório revela que norma revogada poderia ser usada para aumentar arrecadação de impostos
Um relatório interno da Receita Federal, datado de setembro de 2024, revela que um dos principais objetivos da Instrução Normativa que ampliaria o monitoramento das transações digitais, em especial do PIX, era comparar os dados obtidos com a renda declarada no Imposto de Renda das pessoas físicas.
Esse posicionamento foi apresentado em um documento chamado Exposição de Motivos, elaborado por auditores fiscais e encaminhado ao secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, no dia 10 de setembro de 2024. O material, divulgado pelo jornalista Cedê Silva no site ofator.com.br e também acessado pela Gazeta do Povo.
A polêmica e a reação do governo
A controvérsia ficou conhecida como “crise do PIX” e gerou desgaste para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva em janeiro (hoje com apenas 24% de aprovação e 41% de reprovação). A administração federal insistiu que a norma não previa taxação do PIX, com o próprio presidente reforçando essa mensagem em um vídeo onde realiza uma transferência via PIX para o time de futebol. O governo também argumentou que a medida tinha como foco o combate a crimes financeiros.
No entanto, a oposição, especialmente por meio de um vídeo do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), alertou que a norma poderia ser usada para aumentar a arrecadação tributária por meio da aplicação de impostos já existentes.
A Instrução Normativa RFB nº 2.219/2024, publicada dias depois do documento interno da Receita, determinava que fintechs e bancos digitais informassem à Receita Federal as contas de pessoas físicas que recebessem mais de R$ 5 mil em PIX no mês e de pessoas jurídicas que movimentassem mais de R$ 15 mil. Após forte repercussão negativa, a norma foi revogada em 15 de janeiro.
O verdadeiro objetivo da norma?
Apesar de o governo ter afirmado que a medida visava combater a lavagem de dinheiro, a Exposição de Motivos sugere que a principal intenção era identificar possíveis omissões de renda nas declarações de Imposto de Renda. Embora o documento não afirme explicitamente que haveria cobrança de tributos sobre essas movimentações, também não descarta essa possibilidade.
Um dos trechos do relatório menciona o interesse do Fisco em monitorar as transações realizadas por meio de contas digitais de instituições como Nubank, Banco C6 e PicPay.
Especialistas e oposição questionam
Com a revelação do documento, especialistas voltaram a afirmar que a norma poderia, sim, resultar em maior arrecadação de tributos. A advogada tributarista Maria Carolina Gontijo ironizou a situação nas redes sociais: “Quem poderia imaginar que a Receita Federal queria arrecadar mais de quem tenta se esconder dela?”.